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Marco Civil da Internet – Será este o caminho mais Seguro de Navegar?

Após 03 (três) anos de tramitação no Congresso Nacional, com idas e vindas, emendas sobre emendas, e vários adiamentos, interferências de Partidos Políticos, finalmente no último dia 25 de março de 2014, em votação simbólica na Câmara dos Deputados, foi votada as regras que determinarão o uso e exploração da internet dentro dos limites do Território Brasileiro (Projeto de Lei 2.126/2011), denominada Marco Civil da Internet.

Em breve análise começando pelo fim, merece o Brasil ser aclamado por ser o pioneiro na criação de um regramento exclusivo para usuários e provedores de internet, iniciativa esta com repercussão internacional, tanto que, os Estados Unidos, por exemplo, está estudando a possibilidade de criminalizar a prática de “porno revenge” (ato praticado por usuários que publicam na rede mundial conteúdos com cenas de nudez ou prática de sexo com parceiros ou, que estejam de posse desse tipo de conteúdo de pessoas próximas, como forma de vingança). No Brasil, de acordo com a redação aprovada no Marco Civil, em seu artigo 21º, a prática de “porno revenge”, após coleta dos registros de aplicação e conexão da internet, identificado o autor da prática danosa, sua condenação será por crime contra a honra, sem prejuízo de responder no âmbito civil, no dever de indenizar por abalo moral.

Mas como nem tudo são flores, de acordo com a redação aprovada do Marco Civil da Internet na Câmara dos Deputados, o disposto previsto no artigo 21º é a exceção para os casos de remoção de conteúdo ilícito da internet, vez que, naquele caso, basta o envio de uma simples notificação extrajudicial ao provedor de internet e este, após notificado terá de remover ou tornar indisponível prontamente aquele conteúdo, sob pena de responder subsidiariamente pelos danos causados por terceiros.

A regra geral para os conteúdos gerados por terceiro é que o provedor só será responsabilizado após descumprimento de Ordem Judicial, conforme previsto no disposto do artigo 19º do Projeto de Lei aprovado, que afasta da regra geral o princípio americano do “Notice and takedown” (notificação e retirada), sendo prevista sua aplicação apenas no disposto do artigo 21º já comentado.

Para o usuário comum, bem como para o Poder Judiciário, a regra geral trará reflexos altamente negativo ao usuário de internet por vários motivos, dentre eles: 1. dano potencialmente lesivo sobre a vítima que teve um conteúdo ofensivo ou ilícito publicado na internet, em decorrência deste ter que aguardar uma ordem judicial que determine a intimação do provedor de internet para remoção ou indisponibilização daquele conteúdo; 2. O manejo de ações dessa natureza aumentará os entraves no Judiciário, sempre alcançados pela morosidade na apreciação e decisão do pedido, gerando ineficácia na tutela jurisdicional pleiteada.

Importante salientar que, o provedor de internet realmente não pode ser responsabilizado por conteúdo gerado por terceiro (artigo 18º do Marco Civil), até porque não tem parâmetros de controle para saber o que é lícito ou não, mas a questão que se discute é o momento em que se tem o alcance da responsabilização do provedor, pois nos termos do artigo 19º só é possível requerer responsabilização após descumprir ordem judicial, sendo que na rotina dos dias atuais, basta uma simples notificação extrajudicial requerendo a remoção do conteúdo e o provedor se negando a cumprir passa então a responder civilmente por conteúdo gerado por terceiro, sem necessariamente ter que aguardar a ordem judicial para tal.

Apesar de ainda ser possível revisão no texto pelo Senado, que votará o texto aprovado na Câmara dos Deputados, merece uma atenção reforma o disposto no artigo 19º do Marco Civil, para que seja substituída a ordem judicial por notificação extrajudicial, como já mencionado, é utilizado nos dias de hoje, vez que trará maior eficácia as necessidades da vítima em ter removido ou indisponibilizado da internet aquele conteúdo.

Com relação a guarda em ambiente seguro dos registros de conexão e aplicação para fins de investigação, conforme previsto nos artigo 13º e 15º respectivamente do texto aprovado na Câmara dos Deputados, apresenta uma contrariedade em relação ao que já fora determinado pelo Superior Tribunal de Justiça, pois de acordo com esta Corte, a guarda dos registros deve ser preservada por 03 (três) anos, prazo este utilizado como parâmetro do prazo prescricional para as ações de indenizações, contudo, não foi esta a previsão dos dispositivos aprovados, sendo determinado a guarda dos registros de conexão pelo prazo de 01 (um) ano, e os registros de aplicação ainda inferior, apenas 06 (seis) meses. O tempo de guarda é muito pequeno, podendo trazer prejuízos a investigação, o mais adequado seriam os 03 (três) anos de guarda, ainda que ambos dispositivos prevejam em seu parágrafos pedidos de aumento de prazo para a guarda dos referidos registros por prazo maior, mas somente autoridade policial e Ministério Público poderão requerer cautelarmente.

Prosseguindo análise ao texto do Marco Civil, correta a desistência da imposição de instalação de datas centers dentro do Território Nacional para armazenamento e disponibilização dos conteúdos trafegados na rede, ordem dada pela presidente Dilma Roussef, como resposta as espionagens eletrônicas americanas. Acertadamente foi retirada do texto, vez que impactaria as empresas em relação a custo desnecessário impedindo investimento estrangeiro. Neste sentido o artigo 11º do Marco Civil atende as necessidades essenciais acerca das informações que trafegam na rede, como coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de Internet dentro do território nacional, devendo ser obrigatória a aplicação da legislação brasileira, os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros. O dispositivo legal em questão atende, e bem, as questões de responsabilizar os autores de eventuais casos de espionagem.

Com relação a tão falada Neutralidade de Rede, foi mantida, conforme se verifica no artigo 9º do Marco Civil, o que é um ponto positivo, no sentido de que todos os pacotes de dados deverão receber o mesmo tratamento pelo responsável pela transmissão, comutação ou roteamento, sendo exceção as necessidades de serviços emergenciais, nas quais terão prioridade. O único inconveniente é a previsão do Estado poder intervir mediante Decreto para assuntos relacionados a trafego na internet.

Por fim, ao que parece o usuário ganhou um forte aliado em se tratando de transparência e proteção de dados pessoais conforme previstos nos artigos 3º e 7º do Projeto de Lei aprovado, sendo garantido ao usuário de internet privacidade e sigilo do fluxo de comunicação da internet; manutenção da qualidade da conexão de internet contratada, exemplo, se contratou 10 Mb será 10 Mb e não 1 Mb; demais proteção e segurança dos dados pessoais dos usuários, que não poderão ser disponibilizados a terceiros sem prévia autorização, bem como políticas e termos de usos com cláusulas explicativas de como serão tratadas e armazenadas esses dados.

Conclusão, o Marco Civil da Internet, como o próprio nome recebe, é um marco no planeta que trafega na rede mundial da comunicação, e foi construído no Brasil, é o que temos de melhor, e de certo trará ao usuário a segurança necessária de navegação, extirpando de vez o pensamento de que, internet é “Terra de ninguém”. Poderiam sim fazer algumas melhorias, mas assim mesmo, Parabéns Brasil!!!

Por: Oscar Daniel Paiva, advogado e CEO do escritório Paiva Advocacia Digital, advogado graduado pela FMU-Faculdades Metropolitanas Unidas; MBA/Pós-Graduação em Direito Eletrônico pela EPD – Escola Paulista de Direito; membro da CDECAT – Comissão de Direito Eletrônico e Crimes de Alta Tecnologia da OAB/SP; membro da Coordenadoria de Processo Judicial Eletrônico da CDECAT-OAB/SP; especializado em Direito Eletrônico-Digital, promove  Treinamento e Capacitação de advogados nos sistemas de Processo Judicial Eletrônico implantado em todo Poder Judiciário Nacional; implantação de Políticas de Privacidade, Políticas de Uso e Políticas de Segurança da Informação; implantação de Planos de Continuidade e Negócios, Cloud Computing, Disaster Recovery Plan (DRP).

marcos

Professor, Embaixador e Comendador MSc. Marcos Assi, CCO, CRISC, ISFS – Sócio-Diretor da MASSI Consultoria e Treinamento Ltda – especializada em Governança Corporativa, Compliance, Gestão de Riscos, Controles Internos, Mapeamento de processos, Segurança da Informação e Auditoria Interna. Empresa especializada no atendimento de Cooperativas de Crédito e habilitado pelo SESCOOP no Brasil todo para consultoria e Treinamento. Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, Bacharel em Ciências Contábeis pela FMU, com Pós-Graduação em Auditoria Interna e Perícia pela FECAP, Certified Compliance Officer – CCO pelo GAFM, Certified in Risk and Information Systems Control – CRISC pelo ISACA e Information Security Foundation – ISFS pelo EXIN.